UM VISIONÁRIO CHAMADO LOBATO

Muitos disseram que o Brasil seria o País do Futuro, a nossa “pátria mãe gentil”, lugar de “ordem e progresso”, como desejavam os mentores da República nascida em 1889, e criticada por Monteiro Lobato por não atingir os objetivos que o primeiro golpe de estado da nossa história justificava como sendo de máxima urgência, devido aos “problemas insolúveis” enxergados pelos discípulos do Positivismo insurgente. E, no entanto, olhem só que audácia do Lobato, um eterno rebelde, como este escrevinhador, que já criticava a letra ufanista do nosso tão decantado hino nacional.
Coisas de Lobato!
Eu mesmo cresci numa atmosfera de puro ufanismo, parecida com aquela, que a última ditadura militar procurou exaltar ao máximo com musiquinhas catequéticas e patriotismo atrelado ao sucesso dos nossos craques no futebol, e que ainda servia de capacho para os poderes estrangeiros, enquanto mandava prender seus opositores, quando não assassinava, fazia-os desaparecer sem deixar rastros, ou simplesmente os silenciava, porque sempre entendeu, como a elite de hoje continua a fazer, que mais vale um bilhão de cidadãos ignorantes, do que um povo esclarecido...
E Lobato, preocupado, anda de um lado para o outro em outra dimensão...
Hoje é comum dizer que o Brasil está na moda; apregoa-se isto por toda parte, e talvez seja verdade mesmo, ainda que a caterva de políticos nacionais use isso para embromar o povo, mas o povo brasileiro, este continua inculto, como há 60, 70, 80 anos, desde a época de Monteiro Lobato.
E ele se impacienta no Parnaso! Tem vontade de descer novamente para alertar corações e mentes...
Calma, Lobato. Tranquilizo-o eu, com toda a modéstia. Deixa estar que este seu discípulo na Terra irá resgatar a honra da inteligência nacional.
Lobato atacava os francesismos de sua época, porque dizia que nós nos assemelhávamos a macacos, que, por ignorar sua própria cultura, insistíamos em imitar os gostos e as modas francesas, exatamente como hoje fazemos em relação à cultura anglo-saxônica!
Não é isso o que fazem as editoras nacionais?! Publicam qualquer lixo que faz sucesso na Inglaterra ou nos Estados Unidos só porque é escrito na língua inglesa, enquanto que aqui no Brasil, dezenas de escritores, em todas os gêneros, esperam por uma oportunidade para florescer!
Por isso Lobato foi o primeiro a fundar uma editora genuinamente nacional, porque, para quem não sabe, na época dele, os livros em português vinham lá da Boa Terra, mas com grafia portuguesa, e ele queria, além disso, publicar autores brasileiros com temáticas nacionais, uma vez que literatura brasileira mesmo só havia Machado de Assis e José de Alencar, assim mesmo sem uma publicação regular, e a procura era mínima!
Sempre fomos detentores de uma pujante bagagem cultural, que remonta da história de três supercontinentes (quiçá mais um ou dois se formos considerar a Atlântida e a Lemúria, mas vai!... Deixa pra lá! Não entremos em detalhes, aqui, insignificantes) e continuamos micos de circo, que cultivam uma literatura abjeta que encontra espaço nas nossas editoras com a mesma facilidade que compramos pipoca na esquina...
E Lobato dá gargalhadas no Parnaso!
Não sei quanto a vocês, mas eu não gosto de pipoca!
Gosto da boa e velha literatura, em qualquer língua, mas tem que ser boa... E como é que chegamos a um veredicto fiel em relação àquilo que se pode ter como boa literatura...?
Não será promovendo de forma desigual o lixo descartável estrangeiro que formaremos uma plateia seleta de bons leitores, porque, para que haja bons escritores em língua portuguesa, necessário torna-se que tenhamos bons leitores...
Vejo daqui, com olhos holográficos, que o Mestre Lobato concorda comigo, nutando complacentemente.
E porque as editoras não mudam este cenário...?
Isto é um tema para o outro blog... Aquele... Lembram-se...?
Voltando ao tema principal deste texto, que é reafirmar a magnanimidade literária de Lobato, bem como seu caráter premonitório, para chacoalhar ainda mais esta alma nacional, meio que obliterada pela política do pão e circo, esta muito mais antiga que Lobato, e talvez ele compactuasse comigo a ideia do Senhor das Águas, devo dizer que Monteiro previu a Web...
Como é que é?!
E Lobato continua a se divertir comigo...
Exatamente, meus queridos e queridas! Vejam pelas suas próprias palavras, tiradas do seu romance O Presidente Negro, e tirem suas próprias conclusões...
“(...) O rádio-transporte tornará inútil o corre-corre atual. Em vez de ir todos os dias o empregado para o escritório e voltar pendurado num bonde que desliza sobre barulhentas rodas de aço, fará ele o seu serviço em casa e o radiará para o escritório. Em suma: trabalhar-se-á à distância. E acho muito lógica esta evolução. Não são hoje os recados transmitidos instantaneamente pelo telefone? Estenda esse princípio a tudo e verá que imensas possibilidades quando à rádio-transmissão se acrescentar o rádio-transporte. (...)”
Querem mais...?
Este outro trecho:
“– Ainda havia jornais nesse tempo?”
“– Sim, mas jornais nada relembrativos dos de hoje. Eram radiados e impressos em caracteres luminosos num quadro mural existente em todas as casas...”
E est’outro:
“(...) Cada colaborador do Remember radiava de sua casa, numa certa hora, o seu artigo, e imediatamente suas ideias surgiam impressas em caracteres luminosos na casa dos assinantes (...)”
“– Que maravilha!...”
Que maravilha digo eu!
É necessário ressaltar, entretanto, que este romance “O Presidente Negro” se passa no futuro.
Não cabem neste blog as muitas maravilhas deste Lobato que sorri para nós lá do Parnaso, onde deve estar agora, contemplando-nos com um misto de compaixão e receio...
Receio porque ele sabe que apesar de o Brasil de hoje ser melhor em relação aquele onde ele viveu, ainda há muita coisa por fazer, e a corja dos aproveitadores e sanguessugas só aumenta, ao invés de diminuir, e a compaixão dos iluminados que antevê a liberdade mesmo onde reside o caos...
Vamos nos lembrar também de que a descoberta da camada do pré-sal é anunciada pela Petrobrás como o pote de ouro no fim do arco-íris, e ele foi um pioneiro entre aqueles que defenderam a pesquisa e a comercialização do petróleo, numa época em que ninguém acreditava existir o tal ouro negro aqui no Brasil. Se tivéssemos começado desde então a procurá-lo, talvez, hoje, já estivéssemos desenvolvidos o suficiente para evitar todas as ditaduras que se seguiram.
Lobato previu até mesmo os charlatães da arte contemporânea, com suas “instalações” de porcarias, literalmente, e em sentido figurado também, e as performances macacológicas de quem planeja ser original a fórceps e não tem nada a mostrar na realidade, refugiando-se numa incompreensão absoluta que é a cara daqueles artistas idiotas de hoje em dia.
Porém, antes deste desfecho monumental, porquanto eu ficaria aqui horas escrevendo sobre este grande Mestre da literatura luso-brasileira, que transcendeu o universo literário, como todo gênio, uma coisa há que mencionar... E os críticos deste blog, se leitores houver, me comeriam vivos se eu não falasse...
À época de Lobato não existia nada em termos de literatura infantil feita no Brasil, e, para quem nunca ouviu falar no Sítio do Pica Pau Amarelo, um dos maiores sucessos dele, esta foi apenas uma de suas múltiplas criações infantis, traduzido já naquela época para vários países, coisa pouco usual entre autores tupiniquins...
Bem, pessoal, acho que era mais ou menos isso que eu gostaria de falar sobre Monteiro Lobato, conquanto o assunto seja praticamente inesgotável, mas não se preocupem...
Outros Mestres virão.

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