A BAHIA DE TODOS OS JORGES

Ê Bahia de Todos os Santos, alegria incontida de todos os brasileiros por onde começou este Brasilzão gigante, arrogante, nascido em berço esplêndido, depois de ouvido o grito do Ypiranga, sem margens plácidas, mas tsunamis crescentes, te vejo despontar no infinito com uma aura de líder invencível, aos pés todo este mundo que te ajudou a nascer...
É o paradoxo da aleluia!
O Brasil é síntese, tese e antítese; convergência dissonante, divergência integrada; saúde e doença num só corpo; todo o mundo num só lugar...
Ê Bahia de Todos os Santos, de Todos os Jorges, não sei qual seja o melhor...
Ensaiei dizer que Tieta do Agreste, Jorge, seria seu melhor lado, mas ainda não conhecia Tereza Batista, cansada de guerra, mas plena de poesia, e Tocaia Grande, um libelo à liberdade de convivência pacífica...
Ainda sobre Tereza Batista Cansada de Guerra eu poderia acrescentar que o quadro é belo, pintado com requintes de poesia popular, um humor erótico às vezes chulo, na maioria do tempo sublime. A Bahia de Jorge Amado é isso: coronéis, cacau, rufiões, miséria, injustiças, violência e prostitutas... Ah, as prostitutas de Jorge!... Quisera eu conhecê-las como ele...
E por falar em prostitutas, Tieta, sem sombra de dúvidas, uma das melhores. Quem diria, de caftina de luxo, a Santa Padroeira de Santana do Agreste, o povo em romaria elevando-a em santas orações, e grande parte da família a sugar-lhe o sangue.
O desfile de tipos característicos não foge à regra de Jorge Amado, mas o mais interessante nesta história é a conclusão: a figura mais importante de uma comunidade é uma puta! E todos a reverenciam pelo que ela aparenta, e não pelo que ela é, e ninguém está interessado na verdade... Que paradoxo maravilhoso esculpido pela pena de um Mestre!
Gente! Santana do Agreste é uma metáfora do Brasil! Aqui nós vamos encontrar todas as mazelas de um país em formação, cheio de casuísticas e factóides, mas também com características que prenunciam um futuro invejável...
E a escultura de Perpétua, venal, interesseira, e de alma prostituta. Destes parasitas o país está cheio! Muitos governam o país há gerações!Tieta, meretriz na vida, alma magnânima; Perpétua, um modelo de mãe(?), temente a Deus e aos valores da sagrada família(?), mas uma filha da puta em carne e osso! Belíssima composição de Jorge, e belísimo contraponto também...
E o povo ingênuo e brincalhão de Santana, amigo da esbórnia verbal e carnal, pândego de nascença, e como o Curupira, a despistar os caminhos do previsível.
Como sói no Brasil, herói num dia, vilão no dia seguinte, e Tieta, que chegara nos braços do povo, acaba escorraçada como Belzebu encarnado. Outra bela composição de Jorge, mais um retrato fiel do Brasil de Todos os Santos...
E demônios também.
Santana do Agreste, enfim, é uma festa para pobres e ricos; um micro universo como toda boa obra literária. Um lugar onde se respira talento, bondade e pusilanimidade; que vive de trombada em trombada, mas cujo povo não desiste. Assim é também Tereza Batista Cansada de Guerra, aliás, tal alcunha deveria acompanhar o patronímico de todos aqueles nascidos neste país...
(concluo na semana que vem)

Comentários