SHAMBALA

   

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"CAPÍTULO I: TUDO COMEÇA NO RIO DE JANEIRO.


         Ele viera de muito longe, apesar de nenhum lugar neste mundo ser demasiado longe para ele...
         Aeroporto Internacional Tom Jobim. Rio de Janeiro.
         Era um homem muito discreto. Trajava-se como um autêntico turista norte americano, embora ninguém pudesse adivinhar a nacionalidade de um cidadão qualquer apenas por suas roupas...
Não hoje em dia.
O fato é que ele era realmente norte americano, pelo menos na sua origem, mesmo que ele tivesse passaporte livre para entrar em qualquer país deste planeta, entretanto, muito provavelmente, ninguém iria reconhecê-lo.
         Circulou pela cidade em taxi de luxo, pedindo ao motorista que não poupasse esforços no sentido de demonstrar um pouquinho a verdadeira natureza da cidade para ele. Obviamente, o motorista entendeu da maneira dele este pedido. Não pudemos conferir todos os lugares que nosso hóspede visitou, mas com toda a certeza passou por algumas favelas...
         Podemos, sim, verificar o sorriso de espanto deste visitante logo após circular por uma das maiores e mais problemáticas favelas do Rio de janeiro, o complexo da Maré...
         Sinceramente, não podemos sequer imaginar o que estaria passando pela cabeça deste homem enigmático, entretanto, podemos tecer conjecturas...
         Acho que ele estaria avaliando o nível de estrago social ocasionado por aquela política milenar de segregação de todos os povos não híbridos de Anunnakis, que se originaram ainda antes da grande catástrofe que destruiu quase inteiramente a superfície civilizada deste planeta acerca de 12.000 anos...
Depois de conferir o seu registro de hóspede ele foi direto para o restaurante do hotel. Parecia bem familiarizado com o ambiente. Ele só carregava uma mala pequena, que nem se parecia com uma mala, e sim uma dessas bolsas que as pessoas carregam para todo lado, perfeita para transportar somente o essencial.
         No registro do hotel, este homem, este norte americano misterioso, constava com o nome de Wallace Perth, mas o seu verdadeiro nome, pelo menos o nome pelo qual seus principais inimigos nesta história o conheciam, era James Butt.
         Butt atravessou a porta do restaurante e procurou estudar o ambiente, depois se dirigiu a uma mesa solitária e se sentou. A vista era maravilhosa! Butt podia contemplar uma boa parte da praia de Ipanema. Ele acendeu um cigarro, genuinamente americano, e pôs-se a observar o movimento das sereias à beira-mar...
         Sereias humanas, claro...
         Porém, atrás dele, numa outra mesa igualmente solitária, encontrava-se um seu conterrâneo, pelo menos assim Butt avaliou-o tão logo se sentara devido ao sotaque do homem, ainda que não tivesse se virado para ver de quem se tratava.   
         Butt ouviu o desconhecido americano dizer ao garçom, em inglês, naturalmente, embora ele falasse o português quase corretamente:
         – Dê-me o seu melhor café brasileiro... – o garçom ia se retirando, mas o conterrâneo de James Butt fez questão de frisar: – Rapaz, veja bem, só me interessa o autêntico café brasileiro. Não vai esquecer...
         O garçom saiu para cumprir a ordem do exigente freguês com um sorriso de comiseração...
         Ou seria de deboche...?
         Butt solicitou a presença de outro garçom.
         O rapaz aproximou-se.
         – Um scotch, por favor – disse Butt em inglês. Ele nem imaginava como se poderia pronunciar isso em espanhol. Para Butt, naquele país, falava-se o espanhol. – Puro e sem gelo – completou o espião norte americano.
         Nisto, aquele seu conterrâneo da mesa vizinha, advertiu:
         – Você tem certeza que não quer nem provar um cafezinho? – Butt olhou para trás, surpreso. – Olha que isso aqui é pura joia! Você não encontra este tipo de café em nenhum lugar do mundo... Nem mesmo no Egito!
         Butt virou-se e fitou o conterrâneo de frente, com um sorriso pra lá de discreto. Ele pôde perceber que o seu conterrâneo era mais alto do que ele; tinha os cabelos castanhos claros cobrindo as orelhas, e, apesar do sotaque genuíno de Nova Iorque, pelas suas roupas, mais parecia um carioca da gema do que um estrangeiro. Butt mudou de cadeira e ficou de frente para o estranho conterrâneo.
         – O senhor mora no Brasil? – perguntou Butt com certo interesse.
         – Há exatos dez anos – mencionou o outro, muito à vontade. – E o senhor? Já conhecia o Brasil?
         Butt fez um gesto indicando que ele e este país eram amigos de longa data, depois completou:
         – Sempre vim aqui a negócios, mas desta feita estou de volta a passeio.
         – E o que o senhor espera encontrar por aqui? – volveu o estranho, muito curioso.
         – Talvez o senhor possa me ajudar... – retrucou Butt, amigavelmente.
         – Perfeitamente... – anuiu o desconhecido. – A propósito, meu nome é Samuel Paxton, correspondente do Jornal New York Times, às suas ordens.
         – É mesmo?! Muito prazer! James Butt para os íntimos.
         Enquanto os dois norte-americanos faziam as devidas apresentações, alguém muito interessado nos dois personagens passava totalmente despercebido de todo mundo, mesmo para um homem que aprendera a desconfiar da própria sombra, como era o caso de James Butt...
         A sinistra figura fazia lembrar um boneco de vitrine, tal o jeito de se vestir e de se comportar, quase sem se mexer, como um inseto mimetizado ou coisa que o valha. O fato verdadeiramente curioso é que para as outras pessoas que se encontravam naquele restaurante, um número, convenhamos, pequeno, o misterioso personagem parecia não estar ali, como se fosse uma peça de decoração que ninguém mais dá valor, ou um fantasma oculto na paisagem, no entanto ele estava bem vivo, e de olho nos dois norte-americanos que agora conversavam tranquilamente...
         – Diga-me uma coisa, Paxton...
         – Nada de Paxton. Pode me chamar de Sam. Todo mundo aqui me chama assim...
         – OK. Sam. Mas então, Sam, por que você citou o Egito? Por acaso você já esteve lá alguma vez...?
         – Como correspondente do New York Times aonde eu ainda não fui?
         – No Himalaia, por exemplo...?
         – Sim, e na China, na Índia, no Tibet...
         – E na Sibéria?
         – Sibéria?! – volveu Sam, verdadeiramente espantado. – Mas por que a Sibéria?! O que a Sibéria tem a ver com isso?
         – E o México, Sam...? Você já esteve no México?
         – Inúmeras vezes – exclamou o jornalista enfático. – Mas o que todos esses lugares têm em comum...? Confesso que não vejo a conexão...
         – Pense, Sam. Reflita.
         – Egito, Sibéria, Himalaia...
         – E o Brasil.
– Não vejo a conexão, Butt.
         – Você me decepciona, Sam – volveu o americano, acendendo outro cigarro. – Incomoda-se?
         – Absolutamente. Fique à vontade.
         – Responda-me, Sam. Existe alguma coisa que liga, irremediavelmente, o Brasil ao Egito, ao Himalaia, ou à Sibéria?
         Samuel Paxton demorou a responder, envolto que estava em dúvidas.
         – Sinceramente, Butt... – disse ele, pensativo. Butt fez um gesto de anuência, soltando toda a fumaça dos pulmões... Toda, não, mas uma boa parte. – Não consigo enxergar nenhuma ligação coerente.
         – Que enigma mais complicado este que acabamos de verificar – volveu Butt, irônico, expelindo mais fumaça que uma chaminé.
         – Pois é. O que podemos concluir daí?
         – Cientistas percorrem o mundo inteiro em busca de respostas, aí você me perguntaria de novo: onde estão essas respostas?
         – No Brasil é que não estão. Isso você pode ter certeza, meu caro Butt...
         – Aí você está redondamente enganado, Sam...
         – Você tem certeza, Butt...?!
         – Absoluta. O Brasil possui a única resposta para o que todos nós estamos procurando, seja no Egito, no Himalaia, ou no México...
         – E a Sibéria...?  
         – Todo e qualquer lugar...
         – Mesmo no fundo dos oceanos?
– Inclusive aí. Para entender melhor as coisas, Sam, nós precisamos de informações. No mundo de hoje os mais bem informados chegam sempre na frente dos outros. As informações corretas ganham uma guerra, Sam... Dá pra entender?        
– Perfeitamente, Butt, ou eu não seria correspondente do New York Times...
         – Então. Você é um homem bem informado ou não é...?
         – Pra seu governo, Butt, eu sou o melhor nisto, fique sabendo...
         – Eu tenho certeza que eles escolheram o homem certo...
         – Talvez a nossa reportagem deva começar investigando aqui mesmo no Rio de Janeiro... O que você acha, Butt?
         – Eu, se fosse o senhor, não perderia uma boa notícia por nada neste mundo...
         E dizendo isto, Butt colocou seus óculos escuros e se pôs a contemplar as garotas de Ipanema.
         – E eu, se estivesse de férias como o senhor – retrucou o jornalista com um sorrisinho irônico – não perderia os encantos do Rio de Janeiro. Tudo o que acontece no Brasil acontece primeiro aqui no Rio. Não perca isto de vista.
         – É... Acho que vou passar aqui uma bela temporada, Sam. Muito obrigado pela recomendação.
         Samuel Paxton levantou-se da mesa e se retirou.
         Aquela figura sinistra que observava a cena impassível, sem ser notada, desapareceu também, como num passe de mágica."

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